domingo, 22 de abril de 2007

Entrevista/ Jornalismo Político



Carioca, formada em jornalismo pela Universidade de Brasília (UNb), Eliane Cantanhêde mora na Capital Federal desde criança e traz em sua bagagem profissional um currículo, se não invejável, pelo menos cobiçado por muitos acadêmicos da área, especialmente aqueles que querem seguir na área de política.

Começou como repórter do Jornal do Brasil, passou pela Revista Veja, foi chefe de redação e colunista do Jornal do Brasil, colunista do Estadão, diretora de redação da Sucursal do Globo e diretora de redação da Sucursal da Gazeta Mercantil, de onde foi para a Folha de São Paulo, em 1997 e trabalha até hoje como colunista, e
assina a coluna "Brasília" aos domingos. Também atuou na tevê, foi comentarista do SBT Brasil, à época comandado por Ana Paula Padrão.

A jornalista que adora viajar - viaja muito a trabalho -, também adora água e adora a profissão. "Tenho orgulho de ser uma profissional séria e uma cidadã bem resolvida". Em entrevista online para o blog do Varela, Eliane Cantanhêde fala sobre jornalismo político. Sua especialidade. E deixa um recado aos focas:
"sempre acho que cada um de nós tem que acreditar que é possível, sim, mudar o país e o mundo para melhor. Um pouco de utopia não faz mal a ninguém e é absolutamente fundamental aos jovens, em especial jovens candidatos a jornalistas". > "Sucesso a vocês!"

blog do Varela - Na sua visão, que base política precisa ter um acadêmico de jornalismo que queira seguir nessa área?

Eliane Cantanhêde -
Deve ler jornais, revistas, artigos. Deve ver TV, ouvir rádio, estar atento à internet. Mas deve fazer tudo isso com um olhar crítico, contrapondo posições e versões para poder entender bem, e sem paixão, ao ambiente e os atores políticos.

Além disso, é importante diversificar os cursos na universidade, com aulas de ciência política, de línguas, de política externa, de economia...

bV - Além de cursos e aulas de ciência política e de política externa, por exemplo, que outras atividades colaborariam com a formação de um olhar critico do acadêmico?

EC -
Leitura de livros de história, participação em encontros e debates, acompanhamento de dados de entidades como a Transparência Brasil. Isso ajuda muito.

FONTES>

bV - Quais são as fontes mais confiáveis para o jornalismo político?

EC - São os próprios políticos, porque eles são os atores principais do processo. O importante é uma rede de fontes plural, diversificada, de praticamente todos os partidos e, sobretudo, de governo e oposição. Ouvir muito, checar, confrontar são verbos essenciais na profissão. Não se esqueça de que política é símbolo e é palavra.

Além disso, é importante recorrer a documentos, a investigações, a fontes que tenham informações e dados sobre o mundo político, como Ministério Público, Polícia Federal, Judiciário. E, last but not least, há muita gente na academia estudando há anos processos, partidos e a história. Convém ouvi-los muito, como análise e compreensão de cenários.

bV - Você acredita que o acesso a fontes de renome (de fora da academia), que há anos vêm estudando processos, partidos e a história, é atividade fácil ao jornalista recém formado, se comparado ao acesso aos políticos, que via de regra querem "aparecer"?

EC - Não. Há fontes de difícil acesso em todas as áreas e a dificuldade é maior, claro, quando o jornalista é jovem e pouco conhecido. Mas, como em tudo, há exceções. E cabe ao jornalista, jovem ou não, insistir, insistir, insistir e conseguir.
INÍCIO DE CARREIRA>

bV - Em episódios como o escândalo do mensalão, onde o jornalista que está começando a trabalhar com a área de política pode buscar fontes que lhe proporcionem um diferencial em relação à cobertura dos demais jornais impressos?

EC - É difícil, mas nada é impossível. Um jornalista que está começando deve ser sobretudo aplicado: ler todas as reportagens a respeito, ter uma relação ambiciosa das fontes e de seus telefones e manter uma noção digamos, panorâmica, do que está acontecendo. No mais, convém ter uma "lupa", para descobrir no meio de tanta notícia frases, parágrafos ou dicas que possam gerar uma pauta diferenciada.

bV - Comumente ouvimos estórias de políticos querendo corromper jornalistas, muitas vezes profissionais experientes. Terias alguma dica para "driblar" essa situação, que pode vir da melhor fonte?

EC - Não existe "melhor fonte" que seja capaz disso. Se é capaz, não é boa fonte. A rechaça, se necessária, tem que ser dura, clara e informada a superiores, para evitar que o sujeito dê uma versão comprometedora.

A melhor forma para evitar esse tipo de constrangimento pela raiz é ter muita credibilidade, conquistada ao longo de uma carreira sólida. Ninguém é maluco de sair por aí tentando corromper os jornalistas, especialmente jornalistas muito conhecidos. Geralmente, as ofertas ocorrem quando há a sensação (ou informação) de que elas têm campo para prosperar. Ou, de forma bem direta: corruptos só tentam corromper quem eles acham que é corruptível.

bV - Existe um limite no jornalismo político, na busca pela informação/ notícia?

EC - Tudo na vida tem limite. No jornalismo político, isso é essencial.

bV - Ainda com relação a limites, há uma regra, ou algo que sinalize na prática do jornalismo político até onde o repórter "pode ir?"

EC - Há duas regras: 1) notícia é o que interessa ao público (no nosso caso, ao leitor); 2) como sempre digo, há muitos anos, jornalistas devem estar próximos o suficiente para ter informações e longe o suficiente para evitar promiscuidade. Vale conversar, ouvir, ler. Não vale participar de articulações, jogadas ou planos políticos. Político é político, jornalista é jornalista.

bV - O campo econômico tem estreita ligação com o campo político. Se o repórter de política possui apenas noções básicas de economia, isso compromete o seu trabalho?

EC - Não, porque uma das qualidades do bom jornalista é que ele tem uma gama grande de interesses e busca sempre informações sobre variados temas. Mas, quanto mais ele puder estudar e entender economia, obviamente será melhor.
DICAS DE PROFISSIONAL>

bV - Que livros e que tipo de estudo você recomendaria para aqueles acadêmicos que querem seguir nessa área?

EC - Livros nunca são demais. "O Reino e o Poder", sobre o The New York Time é excelente, inclusive para mostrar como as idiossincrasias de lá são muito parecidas com as de cá. Livros de história são ótimos, livros de Machado de Assis ajudam a apurar a escrita, pequenos livros explicativos (coleção Folha Explica, do Publifolha, por exemplo), ajudam a aguçar a curiosidade. E, claro, livros sobre o jornalismo brasileiro. As universidades têm boas listas.

bV - Para terminarmos a entrevista, dos livros sobre jornalismo brasileiro, em especial, poderia indicar algum de sua preferência?

EC - Há muitos, mas, já que você me pede um, sugiro "Minha Razão de Viver", sobre o Samuel Wainer. Mostra uma época da história e do jornalismo em que tudo era mais fluido, tudo podia, os jornalistas e os políticos se confundiam: jornalistas faziam política, políticos faziam jornalismo. E deixa evidente como tudo vem evoluindo para maior fiscalização, maior cuidado, maior independência - apesar dos pesares...

Um comentário:

raquel disse...

que entrevista gigante! :D
Coloca uns subtítulos. Mas ficaram ótimas as perguntas e respostas. :)